Saúde íntima e acolhimento: ginecologia para pessoas LGBTQIAPN+
- Greyce Ferreira

- 26 de jun.
- 5 min de leitura
Quando falamos em saúde íntima, não estamos apenas falando de exames ou protocolos médicos. Estamos falando de cuidado, respeito e acolhimento.
Para pessoas LGBTQIAPN+, essa realidade é ainda mais desafiadora: muitas vezes, o consultório ginecológico se torna um espaço de medo ou desconforto. Mas não precisa e nem deve ser assim.
Neste texto, quero conversar com você sobre como a ginecologia pode (e deve) ser inclusiva, acolhedora e sensível às necessidades de cada paciente.
Afinal, saúde íntima é parte da nossa autoestima, da nossa qualidade de vida e da nossa liberdade de ser quem somos!

O que é ginecologia para pessoas LGBTQIAPN+
A ginecologia para pessoas LGBTQIAPN+ vai muito além de atender uma demanda de saúde física. Ela é, antes de tudo, uma forma de cuidado que respeita quem você é. Trata-se de um atendimento que considera sua identidade de gênero, sua orientação sexual, sua história de vida e suas necessidades específicas.
Você já se sentiu desconfortável em uma consulta por não se ver representada ou por perceber que o profissional não sabia lidar com a sua realidade?
Isso acontece porque, por muito tempo, a saúde foi pensada de forma restrita, sem considerar as diferentes vivências e identidades.
Por isso, a ginecologia inclusiva busca criar um ambiente onde você possa falar abertamente sobre sua saúde íntima, seja você uma mulher cis, um homem trans, uma pessoa não-binária ou qualquer outra identidade e seja qual for a sua orientação sexual. É um espaço onde você deve se sentir segura para tirar dúvidas, relatar sintomas e buscar informações sem medo de julgamentos.
Autoconhecimento: a chave para uma consulta eficiente
Você já percebeu como conhecer o próprio corpo faz diferença na hora de conversar com a ginecologista?
Muitas vezes, deixamos para procurar ajuda apenas quando surge um problema, mas o autocuidado é diário.
Entender o seu corpo vai muito além de saber se a menstruação está em dia. É perceber mudanças, identificar sintomas, registrar incômodos, dores ou alterações que possam indicar algo que merece atenção.
Para quem está em transição hormonal, por exemplo, é importante observar como o corpo reage, como as emoções se manifestam e o que mudou na saúde íntima.
Antes da consulta, que tal anotar tudo o que você gostaria de falar?
Anote sintomas, histórico de uso de hormônios ou medicamentos, cirurgias que tenha realizado ou questões emocionais que estejam te preocupando. Esse cuidado vai ajudar o profissional a entender você como um todo e te oferecer o suporte necessário.
Mitos e verdades sobre a saúde íntima LGBTQIAPN+
A saúde íntima de pessoas LGBTQIAPN+ ainda é um território marcado por tabus, invisibilizações e lacunas no cuidado.
Apesar dos avanços em políticas públicas e discussões sobre equidade em saúde, muitos corpos e vivências continuam sendo ignorados ou mal compreendidos dentro dos consultórios.
Vamos desconstruir desses tabus?

"Apenas mulheres cis precisam ir ao ginecologista"
É um mito. Essa ideia é um dos grandes equívocos quando falamos em saúde íntima.
Toda pessoa com vagina, colo e/ou útero precisa ter acompanhamento ginecológico, por exemplo, homens transgênero.
A recusa de profissionais em atender essas pessoas, a ausência de protocolos específicos e o despreparo na escuta podem causar traumas e afastar ainda mais essas populações do acompanhamento médico, colocando vidas em risco.
"Só pessoas LGBTQIAPN+ estão expostas às ISTs"
Outra falsa ideia comum é acreditar que só em relações entre pessoas do mesmo gênero oferecem risco de infecções sexualmente transmissíveis.
A verdade é que toda e qualquer prática sexual desprotegida pode apresentar riscos, independentemente da identidade de gênero ou orientação sexual envolvida.
As ISTs mais comuns, como HPV, sífilis, HIV, clamídia e gonorreia, circulam entre mulheres que se relacionam com outras mulheres, homens gays, pessoas trans, não binárias e, claro, pessoas cisgênero e heterossexuais.
Por isso, é importante manter o uso de proteção (como camisinha externa e interna, barreiras de látex) e realizar testagens regulares.
"Homens trans não engravidam"
Mito!
Pessoas transmasculinas mesmo em uso de hormonioterapia podem engravidar. Negar isso é negar cuidados essenciais à saúde reprodutiva e contraceptiva desses corpos.
A testosterona usada na hormonioterapia de homens transgênero não é um contraceptivo, pois não necessariamente evita ovulação. Portanto, homens trans que se relacionam sexualmente com pessoas com pênis pode engravidar mesmo usando hormônio, mesmo não menstruando.
"Mulheres homossexuais não precisam coletar papanicolau"
Depende!
Mulheres que se relacionam com mulheres muitas vezes já tiveram penetração vaginal e, portanto, devem coletar papanicolau.
O exame serve para avaliar células de câncer de colo uterino, causado por HPV, vírus que se adquire no contato sexual (inclusive com compartilhamento de sex toys!). Portanto, mesmo mulheres que se relacionam apenas com mulheres (ou com pessoas com vulva) devem fazer exames preventivos de câncer de colo uterino.
"Pessoas LGBTQIAPN+ não precisam de planejamento familiar"
Outro grande equívoco. Pessoas LGBTQIAPN+ têm o direito ao planejamento reprodutivo, tanto para prevenir gestações quanto para realizá-las.
Casais de mulheres cis podem querer engravidar; homens trans podem desejar ter filhos biológicos; casais homoafetivos podem buscar fertilização assistida.
O SUS (e clínicas privadas) devem garantir acesso a esse direito com acolhimento e informação clara, sem julgamentos.
"A hormonização substitui a necessidade de cuidados ginecológicos/urológicos"
Ainda que a terapia hormonal (como o uso de testosterona ou estrogênio) traga mudanças significativas ao corpo, ela não elimina a necessidade de acompanhamento médico.
O uso prolongado de hormônios exige exames regulares, acompanhamento da saúde hepática, óssea, cardiovascular e também cuidados com órgãos reprodutivos que ainda estão presentes no corpo da pessoa, mesmo que não estejam mais ligados à sua identidade.
"Não existe protocolo para cuidar da saúde íntima LGBTQIAPN+"
Embora ainda faltem diretrizes específicas em muitos locais, o Brasil tem avanços significativos, como a Política Nacional de Saúde Integral LGBT (desde 2011).
Existem, sim, recomendações e boas práticas, mas é preciso que profissionais sejam capacitados, atualizados e comprometidos em aplicar o cuidado com ética, empatia e ciência.

Papel do profissional de saúde
Ir ao ginecologista não deveria ser motivo de medo ou ansiedade. Um bom profissional sabe que acolhimento vai além da técnica, é sobre empatia, respeito e escuta ativa.
Empatia e escuta ativa
Um profissional de saúde que atende pessoas LGBTQIAPN+ precisa ouvir de verdade. Isso significa escutar sem preconceitos, com o coração aberto, validando suas histórias e acolhendo suas vivências.
Conhecimento técnico e atualizado
A saúde íntima da população LGBTQIAPN+ traz demandas específicas, como uso de hormônios, cirurgias afirmativas, prazer e dúvidas sobre práticas seguras de sexo.
Um profissional atualizado é capaz de orientar de forma clara, sem estigmas, oferecendo informações que respeitem a individualidade de cada paciente.
Respeito à identidade de gênero
Usar o nome e o pronome corretos é o mínimo que se espera de quem está ali para cuidar de você. Mas vai além disso: é respeitar como você se apresenta, reconhecer o seu gênero e criar um ambiente seguro para que você seja quem é, sem precisar se explicar o tempo todo.
A saúde íntima é parte da sua identidade e do seu bem-estar. Buscar ginecologistas que acolham a sua história, respeitem sua identidade e saibam ouvir é um passo importante para que você se sinta mais confiante e empoderada.
Se tiver dúvidas e quiser uma consulta acolhedora, entre em contato comigo!
Estou aqui para ajudar você a trilhar esse caminho. 🤝




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